Biologia em pauta

“Caçador de vírus”, o Biólogo Dr. Luiz Eloy traz sua perspectiva sobre a COVID-19

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Pesquisador aposentado do Instituto Adolfo Lutz (IAL), o Biólogo Dr. Luiz Eloy Pereira é atual conselheiro do CRBio-01 e membro do Grupo Interprofissional da Secretaria de Saúde de São Paulo.

Doutor em Pesquisas Laboratoriais em Saúde Pública, participou da caracterização do Arbovírus Rocio, do Arenavírus Sabiá, do Hantavírus Juquitiba e Araraquara e dos seus respectivos roedores reservatórios, tendo realizado, também no IAL, a contribuição científica de isolar cerca de 40 novos arbovírus.

Por conta de sua vasta experiência com vírus emergentes, já concedeu entrevistas em vários países, ficando conhecido como “o caçador de vírus”!

Confira abaixo a conversa que o Sistema CFBio/CRBios teve com o Biólogo e, ao final de sua leitura, não deixe de conferir o material informativo inédito elaborado por ele, que fez um levantamento exclusivo de dados técnicos e científicos a respeito do novo coronavírus.
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Sistema CFBio/CRBios: De modo geral, como o senhor caracteriza o novo coronavírus, quando em comparação com os já conhecidos vírus dessa família? De que maneira ele se diferencia?

Dr. Luiz Eloy: Com relação aos coronavírus de Importância para a Saúde Pública, destacam-se seis diferentes espécies que causam infecção em humanos. Estudos virológicos revelam que a cepa MERS-COV causa infecções leves a moderadas e que a SARS-CoV-2 (vírus popularmente conhecido como novo coronavírus) é geneticamente 70% semelhante ao SARS-COV.

Entretanto, a cepa SARS-CoV-2 não mostrou a mesma gravidade do SARS-COV, porém apresenta um índice de contágio maior, sugerindo a hipótese de a cepa SARS-CoV-2 ser mutante da SARS-COV.

Vale dizer, além disso, que estudos têm apontado que a emergência dos coronavírus é de origem zoonótica, sendo os morcegos considerados reservatórios naturais de diversos coronavírus.

No entanto, esses agentes podem ser disseminados para outros mamíferos de origem silvestres e para animais domésticos, principalmente quando permanecem confinados em recinto fechados.

A passagem de vírus entre animais silvestres e domésticos de forma repetida favorece a ocorrência de mutações, que originam a formação de novos coronavírus capazes de infectar humanos e, também, capazes de ser transmitidos de pessoa para pessoa, gerando diferentes doenças, surtos e epidemias.

Atualmente, esta é a melhor hipótese que explica a existência da grande variedade de coronavírus de Importância em Medicina Veterinária e Saúde Pública.

Sistema CFBio/CRBios: Com sua experiência em Ecoepidemiologia de Arbovírus e Hantavírus, como o senhor observa a atual pandemia?

Dr. Luiz Eloy: A circulação do SARS-CoV-2, causador da COVID-19, no Brasil e no mundo veio proporcionar graves impactos na saúde pública, principalmente pela forma de transmissão e pela patogenicidade do vírus.

O fato de a transmissão do vírus SARS-CoV-2 ocorrer de pessoa a pessoa - por meio de aerossóis de gotículas de saliva e secreção nasal ou contato pessoal próximo ou, ainda, por contato com objetos e superfícies contaminadas - acelera a disseminação do vírus, o que aumenta a velocidade de propagação da doença na população.

De forma diferente do que ocorre com o SARS-CoV-2, a transmissão de arbovírus e hantavírus não se faz de pessoa a pessoa; para estes vírus, é necessária a presença de um animal vetor para que se suceda a transmissão.

Isso nos permite vislumbrar que o controle das arboviroses e das hantaviroses é menos complexo que o controle da COVID-19.

Isso porque, com relação às arboviroses, basta controlar os artrópodos vetores e no caso das hantaviroses, os roedores transmissores. Ou seja, você controla a população de vetores e consegue acabar com a doença.

Já quando falamos da COVID-19, que tem como característica a transmissão inter-humana, a ocorrência de pandemia é muito mais provável, porque o controle da doença envolve o controle da circulação das próprias pessoas, devendo-se buscar evitar ao máximo as aglomerações.

É impossível haver uma pandemia de hantavirose, porque o contágio é focado numa determinada área onde estão os roedores contaminados. O mesmo raciocínio vale para as arboviroses.

Tomemos como exemplo a dengue, aqui no Brasil. Temos a dengue no país todo, temos vários surtos, mas não chega a ser uma pandemia, porque não há transmissão inter-humana.

Sistema CFBio/CRBios: De que forma o senhor, como Biólogo, tem trabalhado em relação aos coronavírus?

Dr. Luiz Eloy: Atualmente, na qualidade de pesquisador aposentado do Instituto Adolfo Lutz, atuo na assessoria técnica de levantamento, diagnóstico, controle e monitoramento da fauna de roedores, mosquitos, flebotomíneos e moscas - fauna associada à Transmissão de Doenças de Importância para a Saúde Pública.

Com relação aos coronavírus, tenho atuado como virologista em reuniões científicas, cursos e oficinas, além de palestras. Nessas reuniões, são discutidas questões de epidemiologia, envolvendo biossegurança de viroses emergentes.

Também atuo no enfrentamento com a difusão de informações para a sociedade, enquanto Conselheiro do CRBio-01 e membro do Grupo Técnico Interprofissional da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo.

Sistema CFBio/CRBios: E como os Biólogos e Biólogas em geral também podem contribuir no enfrentamento à pandemia?

Dr. Luiz Eloy: Os Biólogos já vêm contribuindo muito antes da emergência do SARS-CoV-2 (COVID–19), mediante participação nas áreas de pesquisas, ensino, assistência, assessoria, consultoria, direção e gerenciamento, especificamente nas grandes áreas da Saúde e da Biotecnologia e Produção.

Na área da Saúde, destaco ainda a atuação de diversos Biólogos que participaram na identificação genômica do SARS-CoV-2.

E no papel de Direção, destaca-se o diretor-presidente da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, que foi injustamente ignorado pelo Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro. Também exalto o Instituto Adolfo Lutz, atualmente dirigido por uma Bióloga.

Sobre o papel diretivo e de comando de instituições, acho válido comentar que todo profissional que ocupe uma diretoria tem que ter potencial técnico e político, mas, para além disso, deve contar com boa assessoria multidisciplinar, para auxílios e complementações.

No caso da atual pandemia, no que se refere aos institutos ligados à saúde, a vantagem de um Biólogo ocupar a direção é o fato de que possui conhecimento zoonótico. Mas uma equipe multiprofissional é sempre importante, pois contribuirá nas questões clínicas e de diagnóstico.

Sistema CFBio/CRBios: Como tem sido a atual dinâmica do Grupo Interprofissional da Secretaria de Saúde de São Paulo, do qual o senhor participa?

Dr. Luiz Eloy: Nós nos reunimos (agora virtualmente) para criar estratégias para auxiliar a saúde pública, prestando, então, um serviço para a comunidade e, indiretamente, para o próprio governo.

As reuniões recentes têm sido importantes para estimular os Conselhos profissionais da área da saúde a desenvolver ações para combater o avanço da COVID–19, em especial estimulando a divulgação de informações para a sociedade.

Temos, no geral, uma interação direta com a população, frequentando, por exemplo, parques para informar sobre as questões de saúde pública e realizando orientações individuais.

Fazemos oficinas abertas com Biólogos, enfermeiros, médicos, nutricionistas, educadores físicos. Todos orientando as pessoas sobre a importância da saúde. Isso é muito importante.

É por isso que eu gosto desse grupo. Ele é muito envolvente e, além disso, tem um impacto grande na nossa profissão, firmando o Biólogo como profissional da saúde.

Sistema CFBio/CRBios: Por fim, como pesquisador científico aposentado do Instituto Adolfo Lutz, de que forma o senhor enxerga o papel do IAL nesse atual cenário?

Dr. Luiz Eloy: Como sempre, o IAL tem sido fundamental, assim como o foi em todas as epidemias que já ocorreram no estado de São Paulo e no Brasil.

O Instituto Adolfo Lutz foi pioneiro na padronização do diagnóstico e na vigilância epidemiológica de diversas doenças, tendo esses padrões servido como referência para o Ministério da Saúde do Brasil.

Entre as diversas doenças a que me refiro, destacam-se a epidemia da Meningite Meningocócica, Arbovirose Rocio, AIDS, Dengue, Febre Amarela, Arenavirose, Hantavirose e Influenza Aviária, além da atual, a COVID–19.

Entendo ter sido injusta a crítica que o Instituto sofreu na mídia pelo atraso dos resultados dos testes para COVID-19. Esse atraso foi devidamente justificado pela falta de insumos para a realização dos testes, de modo semelhante ao que ocorreu em vários países, devido à explosão do número de casos mundiais.
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Confira aqui o material elaborado pelo Dr. Luiz Eloy, com informações sobre o novo coronavírus sob uma perspectiva técnica e científica!

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